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Militar conta experiências no Haiti

Gabriele Bordin

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Fotos: Arquivo Pessoal

O gabrielense Jean Alex Custódio Machado, 47 anos, é militar e aluno do mestrado profissional em Tecnologias Educacionais em Rede, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Entre as experiência no Exército Brasileiro, Jean passou sete meses em missão de paz no Haiti. Ele é formado em Matemática pela Universidade de Brasília (UnB) e pós-graduado em docência do Ensino Superior, pela Universidade Castelo Branco, e em Telecomunicações, pela Esab. Jean também trabalha com locução de rádio, é cerimonialista em formaturas e, por lazer, gosta de fotografia. Ele é filho de Ivanir Ferraz Machado, 66, e Iracy Pereira Custódio, 68, e tem três filhos, William, 15, e as gêmeas Ingrid e Alessandra, 14. Os filhos, o Exército Brasileiro e a educação resumem as paixões de Jean, que também é autor de um livro infantil e três prosas. Nesta entrevista, ele lembra momentos no Haiti e outras passagens marcantes da trajetória.

Diário - Como se iniciou a sua história com o Exército Brasileiro? 

Jean Alex Custódio Machado - Em 1990, ingressei nas Forças Armadas como soldado. Depois, entrei na Brigada Militar e voltei para o Exército pela Escola de Sargento das Armas (Esa), onde segui carreira. Em função das transferências, morei no Acre, por três anos, em Santa Maria, por quatro, e, em Brasília, por 15. Decidi retornar a Santa Maria em 2016 para que meus filhos estudassem no Colégio Militar. Hoje, sirvo na 3ª DE.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Na formatura do Ensino Fundamental do filho William, no CMSM

Diário - Que lembranças você tem do início da missão no Haiti?

Jean - Em 2004, a missão do Haiti começou. Então, o Brasil enviou a primeira turma. Como eu sabia que um dia iria, comecei a me preparar psicológica e intelectualmente, o que cada militar precisa fazer sozinho. Não nos é exigido e nem oferecido nada além do teste psicotécnico. Li matérias e busquei informações na internet. Fui para o Haiti em novembro de 2008, onde fiquei até julho de 2009. Foram sete meses marcantes. Quando cheguei lá, percebi que tinha muita comida no quartel, mas enquanto isso, passando do muro, vigente morrendo de fome. Fiquei tão impactado que cheguei a reduzir a minha alimentação. O amparo dos militares é muito bom e necessário. Em situações assim, o desgaste é muito grande.

Diário - Como você resume essa missão internacional?

Jean - Em duas palavras: oportunidade e gratidão. Oportunidade por ter representado o meu país e gratidão em não ter acontecido nada de mal com ninguém. É uma grande experiência de vida. Falar de pobreza é totalmente diferente de vivê-la. Sempre que saía à rua, fazia fotos e vídeos do que presenciava. A maioria delas tenho usado para mostrar a situação do Haiti.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Junto às filhas, Ingrid (à esq.) e Alessandra, no Colégio Militar de Santa Maria (CMSM)

Diário - Destacaria um momento marcante dessa experiência?

Jean - Todos são. Mas houve um momento que ficará em minha memória. Ao visitar a localidade de Cité Soleil, me deparei com um local cheio de lixo, onde todas as casas são de zinco, mesmo com a temperatura marcando 40ºC. Quando vi a situação, pensei o quanto o Brasil é privilegiado e abençoado. Em nosso país, mesmo existindo pobreza, nunca vi algo a tal ponto.

Diário - Qual é o sentimento de passar por essa experiência?

Jean - Chorei ao entrar e ao sair do Haiti. Na verdade, me senti impotente e pequenininho. Até hoje, penso que poderia ter feito muito mais e não consegui. No contingente em que fiquei, não houve um tiro sequer enquanto estava lá, e ninguém morreu. Porém, logo depois que saí, houve um terremoto com 220 mil mortes. Naquela tragédia, perdi amigos. Cada um dos militares do meu pelotão tinham um afilhado. Eu também. Ele ajuda a fazer compras na feira na parte de negociação com o vendedor haitiano. Como recompensa, você dá algo a ele, como um dólar ou uma fruta. Toda vez que via meu afilhado, eu o incentivava a estudar. O nome dele é Cláudio. Devido ao terremoto, hoje não sei se o Cláudio está vivo.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (Minustah), em 2009

Diário - Como suportou a saudade da família?

Jean - Eu praticava exercícios físicos e terminei uma pós-graduação à distância. Nosso lazer era ir à academia ou correr. Aos sábados, assistíamos a algum filme, tudo dentro do quartel. Mesmo assim, 10% dos nossos soldados passaram a tomar antidepressivos. Em algum momento, o estado emocional os impediu de serem enviados às ruas, prejudicando e comprometendo a missão.

Diário - De onde veio a ideia para a escrita de prosas tradicionalistas?

Jean - Não sou muito tradicionalista. Porém, encontrei um livro chamado Bá, Tchê, de Luiz Augusto Fischer. A obra é um dicionário do repertório do gaúcho. Gostei tanto que o levei para São Gabriel, em uma ocasião em que fui visitar meus familiares. Na minha terra natal, fiz uma brincadeira. Eu ia falando os termos e alguém respondia o que significavam. Depois, formamos frases com as sugestões. Foi um momento bem divertido. Então, minha tia sugeriu que eu fizesse um texto. Aí, escrevi três prosas em gauchês, que resultou em três obras: Uma Prosa em Gauchês, Um Estrangeiro no Rio Grande do Sul e Grenal.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Jean é aluno do mestrado profissional em Tecnologias Educacionais em Rede, da UFSM

Diário - O que o motivou a escrever um livro infantil?

Jean - Em Brasília, frequentando aulas de evangelização com meus filhos, uma das instrutoras deles pediu que eu fizesse uma peça teatral. Então, criei a fábula O Dia em que os Animais Aprenderam a Rezar. Desta história, surgiu um livro didático para colorir. Ele será publicado pela Editora FEB.

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